Muitos amigos de Porto Alegre disseram-me que não
conheciam um santo-angelense sequer durante toda a vida, mas que depois de me
conhecerem, não pararam mais de ver esse povo missioneiro espalhado em todos os
cantos do Brasil.
É fato que as pessoas de minha cidade evadem em
grande escala, e isso, na minha opinião, tem um motivo. Eu e alguns outros
observadores acreditamos que o inconsciente coletivo de algumas cidades (todas
tem isso) são fortes o suficiente para transformar uma pessoa em infeliz, feliz
ou encabrestá-la.
Aqui, há uma pachorrice coletiva inconsciente que
salta aos olhos de todos os forasteiros. Muitos crescem odiando isso, e na
primeira oportunidade, mudam-se. Outros adaptam-se, acostumam-se e amam,
ficando aqui por toda a vida. Mas há, infelizmente, os que não gostam, e acabam
tendo que ficar. Essas pessoas, mesmo que despropositadamente, acabam gerando
um desconforto contagiante no meio que estão inseridos.
Como exemplo cito dois casos bem tradicionais no
comércio, que certamente todos já se depararam. Os dois são oriundos da mesma
função: caixa.
Se eu compro algo em um estabelecimento e digo que
pagarei com cartão, a pergunta que normalmente acontece é: débito ou crédito?
Ok, até aí tudo bem, mas eventualmente o caixa apenas pergunta: crédito?
Experimente responder não para a pergunta.
Invariavelmente, a pessoa que está lhe atendendo
redarguirá com outra pergunta, que é: débito?
Uma vez eu fiquei tão irritado com a segunda
pergunta, pois estava com pressa, que joguei a pressa fora e perguntei: tem uma
terceira opção?
Ora, se há apenas crédito e débito, e não é
crédito, o que então faz a pessoa perguntar novamente quanto a única opção
remanescente? Minha resposta está no início do texto. Pessoas que acabam tendo
que ficar em algum lugar querendo estar em outro, ou em uma profissão que não
gosta, etc.
Humildade é legal, louvável e admirável. Ambição,
embora saudável, não é obrigatória. Ganância é condenável. Mas absolutamente
nada disso justifica o conformismo de trabalhar tão infelizmente, que não se
digna a pensar sequer.
Se algum dia eu tiver que trabalhar sem pensar,
mate-me! Eu não aguentaria esse fardo.
O segundo exemplo ainda falando de caixa, é que a
grande maioria não pensa em como o cliente irá receber seu troco e se a maneira
como é entregue é a melhor e/ou mais adequada.
Os caixas simplesmente juntam notas, moedas e o
cupom fiscal em uma espécie de cadinho, quase amassado e caindo, e depositam na
mão do cliente. Na verdade, o que de fato acontece é que eles estão entregando
um problema na mão da pessoa que foi efetuar uma compra, pois daquele momento
em diante ele vai ter que pegar as moedas e colocar no lugar onde costumam
ficar (niqueleira, bolso, carteira, bolsa), vai ter que pegar as notas (e quem
trabalha com dinheiro ou é "maniático" ajusta todas as notas com o
rosto virado para o mesmo lado, notas maiores primeiro e menores depois, ...) e
colocar na parte do dinheiro, pegar o cupom e colocar fora, para doação ou
junto com outros cupons.
Simplesmente não há uma preocupação empática com o
cliente, ou até mesmo um respeito solidário quanto ao tempo, pois há apenas a
pressa de atender ao próximo da fila o quanto antes. Então o caixa pega tudo,
junta e entrega rapidamente na mão do comprador, faltando apenas dizer, vai
logo. Próximo!
Vale lembrar que isso não se aplica a todos os
caixas do mundo, apenas aos frustrados e normalmente infelizes.
Conheço muitos caixas que mesmo não amando seu
trabalho, procuram fazê-lo da melhor forma possível. Também é importante citar
que a função é tão digna quanto qualquer outra e não existe demérito algum e
exercê-la.
Sigo a filosofia de tentar fazer sempre do meu
trabalho o melhor possível, transformar o ambiente em algo aprazível, mesmo que
a função não seja exatamente a que eu queria e tenho obtido bons resultados no
que concerne a satisfação pessoal.
Pode não realizar completamente, mas torna o
trabalho bem melhor e a pessoa mais feliz.
É a filosofia do "Ame seu trabalho e você
nunca mais trabalhará".
Publicado em: A Tribuna Regional no dia 06.04.2012
Editado/corrigido/pitaquiado por: Thiago Severgnini de Sousa
Escrito por: @rjzucco
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