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quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Desapego: Parte I



Muitas oportunidades são valiosas para quem gosta de avaliar o comportamento pessoal. Alguns meses atrás meu chefe, em uma reunião, contou o que aprendera em um velório e que poderia se aplicar à empresa. Quando isso aconteceu fiquei pensando com admiração na capacidade que algumas pessoas têm em aprender nas ocasiões e momentos mais inusitados possíveis.
Em abril do ano passado perdi um irmão. Em Junho desse, outro.Em maio, um dos meus melhores amigos perdeu o pai, abruptamente, sem tempo de preparo algum.
Quando um ente querido está enfermo e a passagem é certa, temos tempo de nos prepararmos, de nos despedirmos, de falarmos o que sempre quisemos e protelamos, enfim, temos a derradeira oportunidade de consumar alguns atos que eventualmente venhamos postergando. Mas quando é de "sopetão", um pedaço de nós é tirado de forma agressiva e rude, machucando como um corte profundo incicatrizável.
Com doença fica mais fácil nos resignarmos, aceitarmos e trabalharmos o desapego. Aliás, a palavra de ordem em falecimento é justamente essa, trabalhar o desapego. Principalmente por vermos a pessoa querida sofrendo e por sabermos que o fim da dor é o caminho necessário. Quando entendemos o que a morte significa, sabemos que nossos pais um dia morrerão; nossos avós, nossos irmãos mais velhos, nossos tios... Mas ainda assim, irracionalmente nunca estamos preparados para o momento derradeiro.
O motivo? No fundo a resposta correta é que somos egoístas demais para permitir que as pessoas que amamos evadam de nossa vida antes de nós. Independente se a ordem da vida seja essa. Quem inventou essa droga de ordem afinal? Quem disse que eu preciso segui-la?
Queremos passar ilesos dessa dor por nossa existência mundana. Mas somos pequenos e limitados demais para entender a magnitude do universo e o sentido de cada acontecimento e sua ordem. Pior ainda ficamos quando temos que enterrar um filho ou um irmão mais novo. Mas se analisarmos fria e logicamente, voltamos ao egoísmo. Todos tem sua hora, então quem disse que minha vontade de que fosse depois de mim é a correta frente a infinitude de conhecimento da existência universal?
Independente de religião, todos sabemos que a hora da partida chegará para todos, então como bons egoístas e apegados que somos, queremos que nossos filhos vivam muito e além de nossa existência, bem como os parentes mais novos e ainda não aceitamos também que os mais velhos partam, pois a dor da saudade é grande demais. Afinal de contas, eu não terei mais a companhia da pessoa querida, eu não terei mais a oportunidade de vê-la, eu não terei mais a chance de aprender ou falar com ela, eu não... EU.
É nessa hora que precisamos aprender a trabalhar o desapego, a abandonar o "eu" e entender que o curso natural é esse e que todos tem sua hora, independente se EU acho que o tempo estava errado ou curto demais, a hora de cada um é imutável, e só algo muito acima de nós entende.
Esse é um momento de resiliência, de fé, de crença na transcendência, de força. Mas também é um momento de felicidade ao vermos os parentes queridos próximos, de termos amigos e pessoas que amamos nos consolando e nos apoiando.
É um momento onde eu, quando sinto com toda a empatia do meu coração, sofro junto com meu amigo e minha família, lastimo não poder enfiar a mão em seus corações e arrancar aquela dor a unha e infectar o meu para que assim possa diminuir o fardo de quem quero bem. É o momento em que lastimo não poder materializar todo esse pesado e triste sentimento em uma cruz pesada e postar-me ao lado de quem está sofrendo e carregá-la junto, aliviando-a e acompanhando em tão delicado e particular momento.
E embora nada disso possa ser feito, o simples fato de estarmos ali, ao lado, apenas junto, ou chorando junto, falando besteiras, até mesmo o que não deveria ser dito, ainda assim, estamos fazendo uma diferença permanente, estamos escrevendo em pedra e consolidando algo que jamais será apagado. Construindo uma ponte maciça e larga, de mão dupla e que nos diferenciará de um conhecido.
Estamos aprendendo em um velório. Amadurecendo como pessoas. Consolidando amizades. Entendendo a força e a necessidade de trabalhar o desapego e o egoísmo. Enfrentando a dor da perda e nos obrigando a sermos fortes.
Meus sinceros e profundos sentimentos à quem, como eu, perdeu um ente querido recentemente.

PS: Aproveito a oportunidade para agradecer o carinho de todos que enviaram palavras de conforto pelo celular, facebook, orkut, skype, msn, twitter, e-mail, bem como aos que ligaram, e aos que desconsideraram meu conselho de nao ir ao velório entendendo que minha preocupação era evitar terem que presenciar um ambiente tao triste, preocupando-se mais com meu conforto do que com minha empática preocupação. Especial aos que se fizeram presentes de coração além de qualquer outro canal como a familia Finger e Brustolin, equipe do jornal A Tribuna, funcionários da Imobiliária Jaeger, colegas de trabalho da San Internet, compadres Pippi, amigos e parentes. Foi reconfortante


Publicado em: A Tribuna Regional no dia 23.06.2012
Editado/corrigido/pitaquiado por: Thiago Severgnini de Sousa
Escrito por:  @rjzucco