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quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Administrando fatores aleatórios

Quando vou de casa ao trabalho ou o contrário, o faço por trajetos variados de acordo com algumas circunstâncias. Se estiver chovendo, vou pelo caminho com maior quantidade de marquises. Em caso de calor, por onde há mais sombra. Caso esteja com frio vou pelo trajeto mais ensolarado, e se estou com pressa pelo caminho mais curto. Sigo essa rotina salvo algumas exceções onde preciso alterar o rotineiro curso, como passar na casa de alguém ou em algum estabelecimento comercial.
Estava eu voltando para casa em um dos dias mais frios do ano, não chovia, mas também não havia mais sol, quando optei pelo percurso mais curto para que pudesse chegar rapidamente ao confortável destino quentinho - minha casa. No início do caminho lembrei que precisava pegar pão e então decidi que o faria na padaria a qual passo diariamente em frente.
Absorto em meus pensamentos fui pego de surpresa quando no afã de chegar logo em casa com passo apressado deparei-me com um cachorro rengo no meio da quadra. Não sei se estava rengo de frio, pois devia estar negativa a temperatura, ou se estava rengo de fome ou raiva. 
De certeza tenho apenas minha convicção de que eu não tinha motivo algum para tentar a sorte junto ao cusco. Quando vislumbrei aquela cena de duelo em velho oeste onde de um lado estava eu, parado, encarando o guaipeca e de outro ele, meio rengo, com aquele olhos malévolos que prometiam arrancar com os dentes o precioso pedaço de calça que me protegia do frio. Atravessei a rua!
Quando estava a meia quadra de casa, lembrei do pão. "Saco, logo em um dia tão frio!" Mas por que logo nesse dia esqueci de comprá-lo se passo em frente a padaria diariamente e sempre lembro?
Aí está. Não passei em frente à padaria. Havia um cachorro lá.
O simples fato de haver um guaipeca parado em frente à padaria foi o suficiente para que eu não só não comprasse no mesmo habitual local, como acabou proporcionando-me conhecer um pão de um concorrente também próximo a minha residência, com a vantagem de estar quentinho, pois esta última foi esperta o suficiente para ajustar sua fornada à hora do encerramento do expediente comercial. Resultado: Agora sou cliente do outro estabelecimento.

É claro que no interior do estado do Rio Grande do Sul as empresas não levam em consideração esse tipo de fator aleatório que pode gerar perda de clientes, como um cachorro parado em frente a uma padaria. Possivelmente a proprietária quando viu o pobrezinho ficou com pena e não o enxotou. Certamente não vislumbrou a possibilidade de perder seus clientes. E se por acaso algum outro cliente não entrou naquele horário, muito possivelmente a culpa tenha sido do frio, e não do cusco. Ao menos na visão dela.
Grandes tubarões do mercado prestam atenção em tudo, inclusive no bichinho que eventualmente para em frente ao seu estabelecimento. Todos os fatores aleatórios são ponderados e evitados quando necessário. Isso faz com que mantenham-se no topo da cadeia alimentar mercadológica, devorando vorazmente os peixinhos que não cuidam de eventualidades ou previnem-se quanto a todas as possibilidades.

Justamente estar atento a tudo, aproveitar oportunidades, tirar vantagens da concorrência, prestar um serviço de melhor forma que os outros é o que faz uma empresa virar gigante de mercado e manter-se lá.
Quando que uma pessoa sem noções de empreendedorismo ou administração poderia pensar em um fator tão aleatório quanto esse? Eu respondo: Quando o dono dessa empresa tiver visão o suficiente para transformar sua empresa em um Google, e nesse caso, terá que saber desenvolver as noções faltantes, necessariamente.
Jamais a padaria saberá os motivos que fizeram eu ou os outros clientes conhecermos a concorrência e acabarmos preferindo pão quentinho.
E assim explica-se porque 80% das empresas quebram nos primeiros dois anos de existência. A culpa nem sempre é das pesadas taxas ou da burocracia, muitas vezes a culpa é do proprietário que não tem capacidade de enxergar a quantidade absurda de possibilidades que as pequenas causas geram.

Publicado em: A Tribuna Regional no dia 27.07.2013 
Editado/corrigido por Thiago Severgnini
@rjzucco
rodrigo.zucco@terra.com.br