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quarta-feira, 24 de abril de 2013

Déficit de Atenção





A maioria das pessoas que vivem no interior, quando chegam à capital sentem-se cansadas. Normalmente o choque é grande.
Ninguém percebe de imediato o motivo disso, mas a soma de fatores como poluição visual, medo de assaltos, maior quantidade de gente, poluição sonora, quantidade de carros e estabelecimentos comerciais, distâncias entre as coisas, tamanhos de imóveis, etc, fazem com que cansemos nosso cérebro e iniciemos a aplicação de filtros. Uma espécie de treinamento da mente para ignorarmos a overdose de informações a fim de garantirmos a saúde mental.
Lembro perfeitamente que quando saí de Santo Ângelo orgulhava-me em conseguir reparar quantidades gigantescas de detalhes em uma pessoa com apenas um rápido passar de olhos, e ainda às vezes com visão periférica.
Sempre enxergava as pessoas na rua, os prédios, as casas, os carros e os conduzidos dentro deles.
Hoje, depois de ter morado uma década em Porto Alegre, se eu não ficar olhando por bastante tempo, não consigo mais auferir os mesmos dados de quando saí da minha missioneira terra natal. Brinco com meus amigos que as casas “materializam-se” em minha frente. Esses dias descobri que havia uma casa rosa do outro lado da rua de meu prédio, que para mim havia acabado de materializar-se, mas que sempre estivera lá.
Esse certamente é um dos principais motivos para a deficiência de atenção.
Isso é natural e aceitável quando temos muita informação de todos os tipos e por todos os lados. Nosso cérebro cansa demais para processar e nos deixa esgotados ao final do dia. Como defesa ele começa a filtrar o que não é necessário, importante ou interessante. Dessa forma já não reparamos mais em pessoas na rua, nem em outdoors e propagandas, e até
treinamos nosso ouvido a ignorar sons (quando não passamos o dia com fones).
Outro ponto que contribui para ignorarmos o mundo a nossa volta são as profissões focais, as especializações e afins. Como exemplo cito minha cunhada que é dentista e está acostumada a trabalhar focada na boca, mais especificamente no dente do paciente. Mesmo que ela não queira, isso acaba tornando-se uma característica do dia-a-dia. Ela treina constantemente seu cérebro a ver focalmente e acaba aplicando o raciocínio do foco para tudo. Hoje ela é mais produtiva, incontestavelmente, mas eventualmente não percebe coisas que ocorrem concomitante a determinados acontecimentos, ou seja, acostumou-se tanto
a focar, que filtra o restante de informações que poderiam vir.
Seguindo o exemplo dela temos outros casos de pessoas que acostumam-se a focar tanto que quando entram em algum debate não conseguem perceber os outros pontos e opiniões, ou quando lêem um livro não percebem as interpretações subjetivas e corretas dos autores.
Então de hoje em diante, não se culpe caso as coisas passem despercebidas aos seus olhos. É apenas seu cérebro treinado a filtrar informações descartáveis e reter apenas o que interessa. Mas preocupe-se, pois seu cérebro normalmente considera coisas importantes como sendo algo a não armazenar.


Publicado em: A Tribuna Regional no dia 16.03.2013
Editado/corrigido por Patrick Heinz e @AnaLeticiaSilva
@rjzucco
rodrigo.zucco@terra.com.br
www.rodrigozucco.com.br