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sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Cuidado com o que desejas!

Esses dias, estava conversando com uma amiga, enquanto caminhava pela rua. Ela viu um casal passar de carro com a mulher dirigindo e o cara no banco do carona. Ao ver aquilo minha amiga disse: “nossa, queria muito estar no lugar dela”.
Na hora, achei melhor não comentar, mas fiquei pensando muito a respeito. As pessoas não sabem o que querem. Não têm noção do que pedem.
Fiquei pensando, por conhecer o casal: será que ela se sujeitaria a tudo o que aquela mulher se sujeita? Será que seria tão competente quanto aquela mulher - profissionalmente falando – para construir e manter aquele patrimônio? Será que realmente aquele cara era tudo aquilo? Será que ela conseguiria atender as expectativas daquele cara? Será que aquele tipo de vida a faria feliz? Será que ele vale a pena? Será que ele seria suficiente para ela? Será que ele atenderia suas expectativas? Será que ele daria conta? Será? São tantas condicionais que não temos como saber e, ainda assim, as pessoas desejam sedentas, por algo que às vezes não podem ter. Conforme o dito popular, “roubar e não conseguir carregar”.
Um amigo me disse uma vez que queria muito ganhar uma Ferrari numa promoção, sabe-se lá do que. Então, eu comecei a questioná-lo: Queria mesmo? Para quê? Você tem carteira de motorista? (não) Você tem, ao menos, um emprego? (não) Quem vai pagar o IPVA? E o emplacamento? E a gasolina? E o Seguro? Você ao menos sabe dirigir? (não) Você deseja o carro para ficar parado exposto, estragando? (não) Você quer o carro para vendê-lo? (não)
Ou seja, ele achava que queria o carro, quando, na verdade, ele sequer havia pensado a respeito. Por isso, mulher muito bonita e gostosa tem que ficar com homem malandro e experiente. O cara que quer muito e não parou para pensar nos problemas que vem com algo tão bom, pode não estar preparado para bancar...
Não vou citar quem, no terceiro exemplo, por ser parente, mas ela, sempre que vê um cara saradinho na televisão, larga alguma expressão do tipo “ô lá em casa”, ou “esse é meu tipo de homem”. Eu sempre contorço o pâncreas com os rins num esforço para manter silêncio e não me expressar, pois, ao fazê-lo, estaria, necessariamente, destilando bile corrosiva sobre uma auto-imagem, absolutamente, falha.
Oras, a guria preza família, preza amigos, preza valores retos, preza transparência e preza honestidade. Gosta de ler – normalmente romance e dramas mela cueca – assiste a comédias românticas, gosta de conversar “papo cabeça” e vem me dizer que quer um cara que só pensa em músculos? Para conversar sobre supino e suplementos? Para malhar junto? São mundos e realidades diferentes. Enquanto os “saradinhos” malham o corpo, outros malham o cérebro. Claro que algumas pessoas conseguem fazer os dois, mas quem foca num, acaba dedicando menos tempo ao outro.
É preciso que as pessoas entendam o peso de uma escolha e de um desejo. Costuma-se desejar o que não se tem. Um pouco fomentado pelo consumismo, outro pouco pela cultura da inveja, mas é certo que nada disso tem sentido, se o que deseja não foi realmente avaliado antes.
É necessário que se faça uma análise profunda e reflexiva antes de se desejar algo. A exemplo de Midas, que desejou que em tudo que tocasse virasse ouro e acabou morrendo por isso.
Mais do que escolher o que se quer (para não querer apenas por querer e depois não querer mais), para evitar que se consiga algo que se quer e depois não saiba como lidar ou o que fazer com o que se consegue, há ainda outro ponto. Depois que desejamos algo e não conseguimos administrar as consequências disso, desorganizamos nossa vida e, quem sabe, até a de outras pessoas, numa sanha por satisfação e conseguimos apenas frustração.
Tem gente que define errado o que acha que a fará feliz. Foca no futuro, trilha um caminho que deixa um “rastro de sangue” e caos e, depois que chega onde havia imaginado, entende que a epopeia não valeu a pena, não justificou o esforço, ou nem mesmo trouxe metade da alegria e felicidade esperados.
Fiquei anos estudando para concursos, só depois que passei e trabalhei em um cargo público entendi o quanto não tenho perfil para a função. Isso, depois de estudar anos, de abrir mão de muita coisa e de me estressar muito. Hoje, estou recuperando o tempo perdido. Alguns não têm a segunda chance.



Publicado em: A Tribuna Regional no dia 08.11.2014
Revisado por Cristiano Zucco
@rjzucco
rodrigo.zucco@terra.com.br